Por
que não ela?
Por que não Mariana, que nas
brincadeiras de escola sempre apresentava as melhores ideias e soluções para as
discórdias. E bem ela que sempre tirava as melhores notas e adorava ajudar as
professoras a carregarem seus livros de uma sala a outra.
E logo ela, a menina morena de
cabelos desgrenhados, que subia com agilidade em qualquer planta para colher os
frutos mais maduros para si e seus amigos. Com seu jeito de moleque,
participava de todas as peladas de final de semana com os meninos da rua,
preferindo sempre atuar como atacante.
Mariana, que chorou intensamente a
passagem de sua mãe para terras as quais nem sonhamos definir, e anos depois,
aos sábados, organizava a casa para sua madrasta cantando versos de festa e
paixão.
A menina que adorava cuidar de seus
cães na fazenda, e levava-os passear pelas estradas de chão no final da tarde,
acompanhando-os também na observação atenta do mundo ao seu redor.
Por que não Mariana que concluiu
seus estudos sendo minha colega até o final do Ensino Médio. A garota que
cresceu e dividiu comigo as ansiedades do primeiro emprego e do primeiro
salário.
A mesma que me parabenizava no dia
de meu aniversário, puxando minhas orelhas, enquanto contava a quantidade de
anos que marcava cada data. Que adorava caminhar descalça pela grama do pátio
imenso, não se importando com a terra e pó no seu andar.
E a cada dia que passava ela ficava
mais e mais linda, e eu perguntava, no silêncio de meus pensamentos, “por que
não ela?” Mas as respostas deveriam estar tão e tão longe de mim, que nada
ouvia. Nada recebia que calasse minha indagação.
Num dia cinza, daqueles frios de
inverno, eu vi Mariana pela última vez. Ela saiu de sua casa, vestindo um
grosso e longo casaco preto, carregando nas mãos duas malas marrons. Enquanto
ela partia, repetia incansavelmente seu nome sem dizer uma palavra. Meu olhar
acompanhou-a perdendo-se entre a neblina. Escutei apenas o barulho do portão
fechando.
Voltei para dentro de minha casa,
tentando aquecer algo que congelara em meu peito. Mas nenhuma bebida quente pôde
quebrar o gelo de um coração partido. Por muito tempo observei em minhas
lembranças aquela pintura Dantesca, trágica como Hamlet.
Se eu pudesse voltar atrás, na tarde
em que éramos jovens e o mundo resumia-se em uma árvore, um balanço, eu e ela,
teria dito, ao ter sido interrogado por Mariana, que eu de fato não estava bem,
que dentro de mim um sentimento nascera e há muito tentava evitar. Ao invés de
tanto pedir para mim mesmo “Por que não ela?”, naquele momento teria gritado:
por que não você ao meu lado para o resto da vida?
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